As três parábolas proferidas por Jesus em Lucas 15 tratam basicamente do mesmo assunto o, “a alegria do Senhor pelo arrependimento do pecador”, no entanto, sob perspectivas diferentes.
Jesus narra a história de três coisas que se perderam, mas que por fim foram achadas, a ovelha, a dracma e o filho pródigo. O capítulo 15 de Lucas é conhecido pelos estudiosos como o capítulo das coisas perdidas.
Para compreendermos essas três parábolas de Jesus, precisamos considerar primeiramente, o que o motivou a fazer uso dessas alegorias.
O escritor Lucas, traz o seguinte: “E chegavam-se a ele todos os publicanos e pecadores para o ouvir. E os fariseus e os escribas murmuravam, dizendo: este recebe pecadores, e come com eles. E ele lhes propôs esta parábola, dizendo...” (Lucas 15:1,3). Portanto, concluímos que o que motivou Jesus a proferir aquelas parábolas foi a murmuração dos fariseus contra os publicanos e pecadores.
AS DUAS CLASSES DE PESSOAS DA NARRATIVA
Para compreendermos melhor o texto em apreço, precisamos antes de tudo compreender um pouco mais sobre as classes de pessoas aqui mencionadas, os “publicanos e pecadores”.
Nos evangelhos, essas duas classes são citadas quase que em paralelo (Mt 9.11; Mc 2.15). Os “publicanos” eram os cobradores de impostos daquela época; eram funcionários do governo e eram considerados membros de uma classe privilegiada. Os publicamos eram uma classe social desprezada, abusavam da sua autoridade e cobravam sempre acima daquilo que era justo (Lc 19.8). Eles literalmente exploravam o povo, portanto, não eram bem vistos nos círculos sociais, e eram, também desprezados pelos grupos religiosos judaicos, principalmente os fariseus (Mt 9.11; Mc 2.16; Lc 15.1).
“Os pecadores” era uma forma genérica de se referir àqueles que se entregavam aos prazeres carnais e a desobediência deliberada à lei de Moisés como as prostitutas, os beberrões, os homicidas, ladrões, idólatras etc. Este título também era usado para descrever àqueles que pertenciam aos povos gentios, principalmente os povos considerados invasores como os sírios e os samaritanos. Estes eram considerados impuros e imundos e, portanto, indignos do Reino de Deus.
“Os pecadores” eram atraídos pela pregação de Jesus e se reuniam para ouvir-lhe (v1). Ao contemplar essa sena, os fariseus retrucaram: “...este recebe pecadores, e come com eles” (v2). Jesus não lhes responde objetivamente, mas conta-lhes três parábolas na intenção de fazer-lhes entender como Deus se sente ao ver os pecadores em busca do arrependimento.
As parábolas das coisas perdidas não somente apresenta a posição de Deus com relação aos pecadores, elas também, contêm uma forte advertência e denúncia contra a hipocrisia e o falso zelo dos religiosos, principalmente os fariseus.
As parábolas das coisas perdidas trazem lições importantes, que revelam as intenções de Deus com relação aquilo ou aquele que se acha perdido.
A PARABOLA DA OVELHA PERDIDA
“Que homem dentre vós, tendo cem ovelhas, e perdendo uma delas, não deixa no deserto as noventa e nove, e vai após a perdida até que venha a achá-la? E achando-a, a põe sobre os seus ombros, jubiloso; E, chegando a casa, convoca os amigos e vizinhos, dizendo-lhes: Alegrai-vos comigo, porque já achei a minha ovelha perdida. Digo-vos que assim haverá alegria no céu por um pecador que se arrepende, mais do que por noventa e nove justos que não necessitam de arrependimento” (Lucas 15:4-7).
A parábola da ovelha perdida apresenta a questão do pecado e do arrependimento sob a perspectiva do próprio Deus. Jesus faz essa ilustração a partir do exemplo do cuidado do pastor para com a ovelha.
Jesus inicia sua narrativa com um tom provocativo, “Que homem dentre vós, tendo cem ovelhas, e perdendo uma delas, não deixa no deserto as noventa e nove, e vai após a perdida até que venha a achá-la”. Jesus estava afirmando com isso que Deus era como eles no cuidado com suas ovelhas. Jesus cita este exemplo no intuito de faze-los entender os anseios de Deus com relação aos pecadores.
O verdadeiro pastor de ovelhas, vai em busca da ovelha desgarrada até encontra-la, e quando a encontra se alegra bastante por tê-la achado. A alegria por ter encontrado a ovelha é tão grande que instigue o pastor compartilhar com todos os seus amigos a boa notícia.
Da mesma forma, Deus busca incansavelmente suas ovelhas perdidas, e quando as encontra, se alegra profundamente.
O próprio Deus se identifica aqui como aquele que sai em busca da ovelha perdida. O que Jesus queria ilustrar com essa parábola é que a pregação das boas novas (aquela que ele pretendia entregar aos pecadores ali presentes), seria a maneira que Deus usaria para resgatar suas ovelhas perdidas. Os pecadores ali presentes recebessem a mensagem do evangelho, e se convertessem dos seus pecados, Deus os estaria encontrando naquele exato momento, e naquele mesmo momento haveria alegria nos céus, pois uma ovelha perdida havia sido encontrada.
Ao proferir a parábola da ovelha perdida, Jesus está ao mesmo tempo apresentando uma crítica ao sistema religioso daquele tempo. Eles (principalmente os fariseus) se consideravam as ovelhas legítimas do aprisco de Deus e, portanto, não necessitavam de qualquer arrependimento.
Jesus, em tom de ironia lhes afirma; “Digo-vos que assim haverá alegria no céu por um pecador que se arrepende, mais do que por noventa e nove justos que não necessitam de arrependimento” (Lucas 15.7). Jesus não estava querendo dizer que eles eram justos e que não precisavam se arrepender, mas que eles assim se consideravam. Portanto, a alegria de Deus recaía sobre a centésima ovelha representada aqui pelos publicanos e pecadores, pois estes, realmente tinham consciência de que eram indignos do Reino de Deus, mas que a partir de então receberiam a oportunidade de pertencer ao aprisco de Deus, mediante as boas novas de Cristo.
Alguns na atualidade, principalmente os crentes negligentes, usam essa parábola no intuito de provar que o pastor ou o responsável pela igreja deve viver o tempo todo atrás dos desviados e descomprometidos. Apesar de ser verdade que o pastor deve cuidar do seu rebanho, isso não significa que ele é responsável pelos seus deles. Cada um dará conta de se mesmo diante de Deus (Rm 14.12).
O objetivo da parábola da ovelha perdida é ilustrar que Deus anseia intensamente pela salvação dos perdidos, e que faz tudo o que é necessário para alcança-los e traze-los de volta ao aprisco.
A PARÁBOLA DA DRACMA PERDIDA
“Ou qual a mulher que, tendo dez dracmas, se perder uma dracma, não acende a candeia, e varre a casa, e busca com diligência até a achar? E achando-a, convoca as amigas e vizinhas, dizendo: Alegrai-vos comigo, porque já achei a dracma perdida. Assim vos digo que há alegria diante dos anjos de Deus por um pecador que se arrepende” (Lucas 15:8-10).
A parábola da dracma perdida enfatiza a mesma verdade da parábola da ovelha perdida, mas sob um prisma diferente.
A parábola da dracma perdida enfatiza não somente o fato que de Deus se alegra com o arrependimento de um pecador (v10), ela enfatiza igualmente a responsabilidade individual de cada um diante de Deus.
Podemos encarar essa parábola sob dois prismas diferentes, o primeiro é que Deus é representado nesta parábola por aquela mulher, que busca diligentemente sua dracma perdida (o pecador) até encontrá-lo, e que quando o encontra se enche de alegria (v 8,9). As 9 dracmas que não se perderam simbolizam, como no caso da parábola da ovelha perdida, os judeus, que se consideravam justos diante de Deus, e, portanto, jamais reconheciam a necessidade de arrependimento e consequentemente do perdão de Deus.
A segunda proposta apresenta uma abordagem diferente. A dracma era um tipo de moeda utilizada na Antiga Grécia e em alguns reinos do Oriente Médio, durante o período helenístico. Segundo os estudiosos das Escrituras, uma dracma equivalia ao salário de uma diária de um trabalhador. As dez dracmas representavam todas as economias que aquela mulher dispunha para manutenção de sua casa. Portanto, no contexto desta parábola temos a seguinte escala de valores: a casa representa a nossa vida; as dracmas a vida de Deus ou os bens espirituais; e a mulher representa a própria pessoa que é responsável por sua própria vida.
Podemos iniciar nossa interpretação sob este ângulo fazendo a seguinte pergunta: Como aquela mulher pode perder uma de suas moedas dentro de sua própria casa? Como isso foi possível?
O contexto pode indicar que aquela mulher foi negligente ao cuidar daquilo que ela tinha de maior valor, suas moedas. Ela foi descuidada, mas, felizmente percebeu a ausência de uma de suas moedas a tempo de poder resgatá-la.
Nesta perspectiva, a parábola das dracmas consistia numa crítica e advertência contra os fariseus, que se consideravam os supercrentes daquela época. Eles estavam acomodados aos caprichos da sua religião e não estavam percebendo que suas vidas corriam perigo; haviam perdido aquilo que lhes eram mais caros, a vida de Deus.
A dracma representa a vida de Deus em nós. Jesus adverte que é possível alguém que sustenta o status de um religioso, viver alienado de Deus, isso é, sem perceber que sua alma corre perigo.
A mensagem de Cristo é um convite ao arrependimento. Quando aquela mulher notou a falta de uma de suas dracmas, procurou-a diligentemente até encontra-la.
Jesus sugere três etapas na busca pelas dracma perdida:
· a mulher acende a candeia;
· ela varre a casa,
· e, por fim ela busca diligentemente até encontrar.
Isso parece indicar o motivo que levou aquela mulher a perder uma de suas moedas. O ato de acender a candeia indica que a casa estava escura, isso é em trevas; o uso da vassoura indica que a casa estava suja, isso é, repleta de pecados e imundícias e, por fim ela a busca com diligência, isso é, ela buscou incansavelmente até encontrá-la. Nessa perspectiva, a parábola das dez dracmas traz uma advertência para os falsos religiosos e, ao mesmo tempo, consistia e um convite para o arrependimento.
A PARÁBOLA DO FILHO PRÓDIGO
“E disse: Um certo homem tinha dois filhos; E o mais moço deles disse ao pai: Pai, dá-me a parte dos bens que me pertence. E ele repartiu por eles a fazenda. E, poucos dias depois, o filho mais novo, ajuntando tudo, partiu para uma terra longínqua, e ali desperdiçou os seus bens, vivendo dissolutamente. E, havendo ele gastado tudo, houve naquela terra uma grande fome, e começou a padecer necessidades. E foi, e chegou-se a um dos cidadãos daquela terra, o qual o mandou para os seus campos, a apascentar porcos. E desejava encher o seu estômago com as bolotas que os porcos comiam, e ninguém lhe dava nada. E, tornando em si, disse: Quantos jornaleiros de meu pai têm abundância de pão, e eu aqui pereço de fome! Levantar-me-ei, e irei ter com meu pai, e dir-lhe-ei: Pai, pequei contra o céu e perante ti; já não sou digno de ser chamado teu filho; faze-me como um dos teus jornaleiros. E, levantando-se, foi para seu pai; e, quando ainda estava longe, viu-o seu pai, e se moveu de íntima compaixão e, correndo, lançou-se-lhe ao pescoço e o beijou. E o filho lhe disse: Pai, pequei contra o céu e perante ti, e já não sou digno de ser chamado teu filho. Mas o pai disse aos seus servos: Trazei depressa a melhor roupa; e vesti-lho, e ponde-lhe um anel na mão, e alparcas nos pés; e trazei o bezerro cevado, e matai-o; e comamos, e alegremo-nos; porque este meu filho estava morto, e reviveu, tinha-se perdido, e foi achado. E começaram a alegrar-se. E o seu filho mais velho estava no campo; e quando veio, e chegou perto de casa, ouviu a música e as danças. E, chamando um dos servos, perguntou-lhe que era aquilo. E ele lhe disse: Veio teu irmão; e teu pai matou o bezerro cevado, porque o recebeu são e salvo. Mas ele se indignou, e não queria entrar. E saindo o pai, instava com ele. Mas, respondendo ele, disse ao pai: Eis que te sirvo há tantos anos, sem nunca transgredir o teu mandamento, e nunca me deste um cabrito para alegrar-me com os meus amigos; vindo, porém, este teu filho, que desperdiçou os teus bens com as meretrizes, mataste-lhe o bezerro cevado. E ele lhe disse: Filho, tu sempre estás comigo, e todas as minhas coisas são tuas; mas era justo alegrarmo-nos e folgarmos, porque este teu irmão estava morto, e reviveu; e tinha-se perdido, e achou-se” (Lucas 15:11-32).
A parábola do Filho pródigo retrata o fato de que Deus espera que homens se arrependam dos seus pecados e voltem para ele.
Na parábola do filho pródigo, o pai representa Deus; o filho pródigo representa o homem perdido; o filho mais velho (que não se agradou muito com o retorno do seu irmão mais novo) representa os fariseus, que não admitiam jamais que Deus desse uma chance de arrependimento aos pecadores.
A parábola indica que a atitude de se afastar da casa do pai partiu do próprio filho. Ele era livre para escolher e decidiu deixar a casa do pai para viver para os deleites da vida (v 13). Esta atitude lembra Adão e Eva no jardim, que mesmo tendo a liberdade de escolher obedecer a Deus, preferiram ser desobedientes comendo do fruto proibido.
A trajetória do filho pródigo longe da casa do pai foi bem desgastante, e quase acabou em uma tragédia. Ali, em uma terra distante ele foi humilhado, passou fome, sede e sofreu todo tipo de injustiça. Isso significa que o homem sem Deus, por mais bem ele pareça em seus caminhos, sua vida espiritual irá de mal a pior .
Os sofrimentos daquele jovem em uma terra estranha simbolizam as terríveis dores que alma do pecador sente quando não se está em comunhão com Pai Celestial.
Felizmente (como nas parábolas anteriores), aquilo que se perdeu foi achado, no entanto, o contexto deixa explícito que antes de achar a casa pai, o jovem se achou primeiro: “E, tornando em si, disse: Quantos jornaleiros de meu pai têm abundância de pão, e eu aqui pereço de fome!” (Lucas 15:17,18). A expressão caiu em si, indica que aquele jovem pecador reconheceu seu estado de miséria. Ele estava disposto a confessar todas as suas transgressões diante do seu pai (v 18,19).
Enquanto a parábola da ovelha perdida contempla o arrependimento pelo prisma de Deus, a parábola do filho pródigo a contempla pelo prisma do pecador. Na primeira parábola o pastor “Deus” toma a iniciativa de buscar a ovelha perdida “o pecador”, enquanto na parábola do filho pródigo “o pecador” toma a iniciativa de voltar para casa do pai.
Não se menciona nenhum esforço do pai em tentar dissuadir seu filho do seu intento, e em todo a narrativa não vemos indícios de que ele tenha ido em busca do seu filho perdido; ele simplesmente esperou. No momento certo o filho reconheceu seu estado “caiu em si”, e buscou imediatamente voltar para casa do pai.
Mesmo estando em condições físicas precárias o pai reconheceu o seu filho “...e se moveu de íntima compaixão e, correndo, lançou-se-lhe ao pescoço e o beijou” (Lucas 15:20). Deus espera ansiosamente que os pecadores se arrependam dos seus pecados, e busquem refrigério em sua presença. Na presença do nosso Pai Celestial, encontramos todos os recursos que a nossa alma necessita para viver plenamente.
Mesmo não tendo indo em busca de seu filho, o pai declara que seu filho estava perdido e foi achado (v 24). Isso significa que, mesmo tendo sido desobediente, e ter desperdiçado aquilo que era de seu pai, ele foi aceito com honra, e sem qualquer retaliação por parte de seu pai. Isso significa que, quando o pecador se arrepende dos seus pecados e vem para Deus, ele é aceito, independentemente do que tenha sido ou feito.
Ao proferir esta parábola Jesus queria demonstrar aos fariseus que Deus é capaz de perdoar todos os pecadores que ali estavam, desde que o buscassem com arrependimento. Mesmo sendo aqueles homens grandes pecadores, Deus estava de braços abertos para recebê-los e chamar-lhes também de filhos seus.